terça-feira, julho 30, 2013

SAUDADE





SAUDADE

Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
dói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés

Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas

Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta

Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono

MIA COUTO


Foto de Hamanov Vladimir


sexta-feira, julho 19, 2013

AMOR




Amor
o teu rosto à minha espera, o teu rosto 
a sorrir para os meus olhos, existe um 
trovão de céu sobre a montanha. 

as tuas mãos são finas e claras, vês-me 
sorrir, brisas incendeiam o mundo, 
respiro a luz sobre as folhas da olaia. 

entro nos corredores de outubro para 
encontrar um abraço nos teus olhos, 
este dia será sempre hoje na memória. 

hoje compreendo os rios. a idade das 
rochas diz-me palavras profundas, 
hoje tenho o teu rosto dentro de mim. 

José Luís Peixoto, in "A Casa, A Escuridão"


Foto de Sergey Ryzhkov

segunda-feira, julho 08, 2013

POEMA DA DESPEDIDA



Poema da despedida





Não saberei nunca
dizer adeus

Afinal,
 os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
 nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo

MIA COUTO


Foto de Sergey Ryzhkov


PORQUE VOLTO

  PORQUE VOLTO . Volto, porque há dias antigos que ainda nos agarram com o cheiro da terra lavrada, onde em cada ano, enterrávamos os pés e ...