Naquele tempo era no castelo que se faziam as festas.
Do que mais gostávamos era dos bailes.
Eram dois bailes acompanhados pela mesma música.
Eram dois bailes no mesmo local - o castelo.
No terreiro, de terra batida, sob o mastro colorido de
festões, balões e lanternas de papel, era o mais
concorrido.
Todos aprimorados em seus fatos domingueiros, eles,
com suas jaquetas de dia de festa, alguns com uma flor
na lapela, elas, lindas, em suas blusas floridas de cores
garridas, fazendo sobressair esbeltos bustos.
Aqui no terreiro, ao som da música sempre igual, os
corpos, enlaçados e frementes, rodopiavam, olhos nos
olhos, sempre sob o olhar desconfiado das mães que,
sentadas, vigiavam as moças.
Aqui se fizeram e desfizeram muitos namoricos.
Também por vezes saíam alguns com a cara
avermelhada dalguma chapada que travara uns
avanços mais atrevidos...
Mas se aqui no terreiro, num mar de gente se dançava
assim, o outro baile era na esplanada do castelo.
Piso superior ao terreiro era local indicado para a
gente "bem" da terra.
Funcionários públicos, comerciantes e lavradores que
mantinham assim a distância com o povo do campo.
Elas com seus vaporosos vestidos, alguns
encomendados, em tempo, na cidade.
Eles, perfumados, brilhantina a luzir naqueles cabelos
bem penteados, engravatados em seus melhores fatos.
Deslizavam, dançando, mantendo uma distância
respeitosa a que não era alheia a vigilância materna.
Os do terreiro olhavam com desdém os que dançavam
na esplanada e sorrindo cochichavam com as parceiras.
Na esplanada os olhos dos pares também se
dirigiam para o que se passava em baixo, no
terreiro, e seguiam com ar superior o jeito
da dança.
Aqueles corpos juntinhos no terreiro,
rodopiando como se de um só se tratasse, os
seus sorrisos ingénuos, as suas bocas
aproximando-se a cada passo, as mãos
grossas e calejadas apertando as
companheiras, criavam-lhes um misto de
inveja e desejo.
O terreiro era para os trabalhadores, a esplanada
era para os "finos"
Por vezes o filho dum lavrador, mais afoito, descia a
escadaria e ia dançar para o terreiro. Mil olhos se lhe
cravavam nas costas e a moça que aceitara a dança era
mal vista durante algum tempo...
A noite ia alta quando todos regressavam a casa para
descansar um pouco, pois breve ia começar nova
labuta, manhã cedo, nos campos.
Rostos cansados mas felizes dos que tinham tido nos
braços, por momentos, as mulheres amadas a quem
finalmente tinham declarado e prometido amor eterno.
L.M.
7 comentários:
Adorei este texto!
Fez-me lembrar os tempos da minha meninice e ia para a aldeia dos meus Avós, durante o Verão e, enquanto os meus Pais iam de viagem, em férias...
As férias de Verão eram fabulosas. Tinha oportunidade de conviver, de passear pelo campo, de ir a festas das freguesias vizinhas...
Tenho saudades desses tempos...
Grata por me fazeres reviver momentos inesquecíveis da minha vida!
Um abraço ;)
Bom texto, que me recorda as festas dos lugares:)beijos
Se gostei? Adorei!! Texto enxuto: palavras nem a mais nem a menos, na descrição primorosa do que a memória guardou. Paabéns.
Um abraço.
Menina_marota; Wind; Rain-Maker; Batista Filho:
Estou comovido com a V/ aceitação. É só o que lhes posso dizer por ora.
Bjs e abraços
mais uma visita por este belo cantinho... ao som de Carlos Paredes. Espantoso!
Os bailes já não são o que eram... mas será que ainda há os da "esplanada"? delicioso este texto :) Beijo
Amigo Luís Milhano
Na minha Aldeia, havia poucos ricos, de forma, que não se notava a distinção eles e os pobres.
Por outra, de tanta pobreza, pouca alegria havia para dançar. Cantava-se enquanto se trabalhava, para afastar o pensamento das horas que faltavam para o sol se pôr.
Mas, também havia muitas horas bonitas, quando a Primavera nos oferecia os imensos jardins...inigualáveis, e quando o Sol dourava as searas, que ondulavam como um mar de ouro!
Tenho muitas saudades de gentes e do lugar por onde decorreu a minha infância e juventude.
Adorei o seu texto, muito bem descritas as suas lembranças.
Um Abraço.
Felismina
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