segunda-feira, janeiro 31, 2022

SAUDADE

 




SAUDADE

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Saudade! o teu olhar longo e macio
Derramando doçura em meu olhar...
Um bocado de sol sentindo frio,
Uma estrela vestida de luar...

Saudade! pobre beijo fugidio
Que tanto quis e não cheguei a dar...
A mansidão inédita de um rio
Na volúpia satânica do mar...

Saudade! o nosso amor... o teu afago...
O meu carinho... o teu olhar tão lindo...
Um pedaço de céu dentro de um lago...

Saudade! um lenço branco me acenando...
Uma vontade de chorar sorrindo,
Uma vontade de sorrir chorando...

CIRO VIEIRA DA CUNHA.Ciro Vieira da Cunha, por pseudônimo João da Ilha (1 de junho de 1897São Paulo26 de junho de 1976Rio de Janeiro) foi um professorpoetabiógrafocronistajornalista e médico brasileiro. Embora paulista de nascimento, considerava-se capixaba de coração.[1] Foi membro da Academia Espírito-Santense de Letras, onde assumiu a cadeira de nº 25.

sexta-feira, janeiro 28, 2022

POR TI

 




POR TI
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Com pedaços de céu,
inventei estrelas cintilantes,
para uma galáxia só nossa,
onde pudéssemos viver em paz.
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Agarrei uma porção de azul,
e embrulhei nela todas as ondas
que se espreguiçavam nas praias,
para podermos olhá-las em silêncio.
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Numa qualquer planície castanha,
pintei milhões de espigas douradas,
onde espreguiçámos cansaços,
e saciámos a nossa fome de pão.
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Com os sons que descobri nos ventos,
compuz árias que as aves cantaram
e te ofereceram em breves serenatas,
quando assomavas à janela do sonho.
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Gritei a minha enorme paixão,
embrulhando-te em mantos de ternura,
que negligente, deixavas cair,
para ficares desnudada e liberta.
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Por ti…
Inventei, sonhei, pintei, compuz e gritei!
E mil vezes adormeci ébrio de ilusões!
E mil vezes não consegui acordar!
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ORLANDO FERNANDES
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Foto de Ricardo Machado-1000Imagens

quinta-feira, janeiro 27, 2022

COMO SE ESTIVESSE APAIXONADO

 





Para quem não sabe como é
(como se escreve um poema de amor)
eu vou dizer.

Como se estivesse apaixonado
Falar desse teu corpo exagerado
Que apenas aos meus olhos ganha cor,
De um coração em mim anteestreado
Num palco onde jurei fazer-te amor.
Esculpir esses cabelos impossíveis
Que nunca mãos algumas alisaram,
Desflorar esses vales inacessíveis
Onde os outros de vésperas naufragaram.
Contar como se ardesse de desejo
As pernas de cetim que tu me abriste
E a boca que se derreteu num beijo,
Soluço de sorriso que desiste.
Dizer, porquê? Se todo o mundo sabe
Que quando se ama não se escreve
E que, então, o tempo todo cabe
Naquele instante breve que se teve.
Contar o resto seria apenas feio,
Sentir o que não foi, deselegante.
Falar do que te disse pelo meio
Só se não fosse homem, nem amante...


Fernando Tavares Rodrigues


(Fernando Jácome de Castro Tavares Rodrigues nasceu em Lisboa, no dia 7 de Março de 1954. Professor universitário, sociólogo e escritor, faleceu em Lisboa, no dia 1 de Março de 2006.

Formado pela Universidade Nova de Lisboa em Ciências Humanas e Sociais (Economia e Sociologia), estudou também Comunicação Social e preparou tese de doutoramento em Ciências da Informação e da Comunicação, no Instituto de Psicologia Social Louis Pasteur, em Estrasburgo.

Interessou-se também pela carreira diplomática acabando, porém, por se iniciar no jornalismo em 1974. Como jornalista ingressou em 1974 no Diário Popular tendo, posteriormente, transitado para o Correio da Manhã, mas é ao ensino que dedica grande parte do seu tempo, assim como actividade literária, especialmente à poesia.
Publicou diversos livros, entre os quais, "Memórias de corpo inteiro", "(Ur)gente", "(A)mar", "Concerto para uma voz", "Talvez amanhã", "Depois do amor" , "O amor (im)possível" e "XXI Sonetos de Amor".

terça-feira, janeiro 25, 2022

NUVENS CORRENDO NUM RIO

 




NUVENS CORRENDO NUM RIO

Nuvens correndo num rio
Quem sabe onde vão parar?
Fantasma do meu navio
Não corras, vai devagar!

Vais por caminhos de bruma
Que são caminhos de olvido.
Não queiras, ó meu navio,
Ser um navio perdido.

Sonhos içados ao vento
Querem estrelas varejar!
Velas do meu pensamento
Aonde me quereis levar?

Não corras, ó meu navio
Navega mais devagar,
Que nuvens correndo em rio,
Quem sabe onde vão parar?

Que este destino em que venho
É uma troça tão triste;
Um navio que não tenho
Num rio que não existe.



Natália Correia 

segunda-feira, janeiro 24, 2022

NÃO SEI SE É AMOR QUE TENS


Não sei se é amor que tens, ou amor que finges,
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O que me dás. Dás-mo. Tanto me basta.
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 Já que o não sou por tempo, 
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 Seja eu jovem por erro. 
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 Pouco os deuses nos dão, e o pouco é falso. 
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 Porém, se o dão, falso que seja, a dádiva
 É verdadeira. Aceito. 
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 Cerro olhos: é bastante. 
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 Que mais quero? 
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 RICARDO REIS
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Imagem Tamara de Lempicka 1898/1980

sexta-feira, janeiro 21, 2022

QUANDO


 QUANDO

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Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.
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O ar que respiro, este licor que bebo,
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.
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Nem nunca, propriamente reparei,
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? Serei
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Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.
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ÁLVARO DE CAMPOS
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Foto de Ulvi Magerramov

ECO

 


ECO


Vagas são as promessas e ao longe,

muito longe, uma estrela.

 

Cruel foi sempre o seu fulgor:

sonâmbulas cidades, ruas íngremes,

passos que dei sem onde.

 

Era esse o meu reino e era talvez essa

a voz da própria lua.

Aí ficou gravada a minha sede.

Aí deixei que o fogo me beijasse

pela primeira vez.

 

Agora tenho as mãos vazias,

regresso e sei que nada me pertence

- nenhum gesto do céu ou da terra.

Apenas o rumor de breves sombras

e um nome já incerto que por mágoa

não consigo esquecer.

 

FERNANDO PINTO DO AMARAL

 

Foto de Olga Maleeva


PORQUE VOLTO

  PORQUE VOLTO . Volto, porque há dias antigos que ainda nos agarram com o cheiro da terra lavrada, onde em cada ano, enterrávamos os pés e ...