sexta-feira, janeiro 21, 2022

QUANDO


 QUANDO

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Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.
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O ar que respiro, este licor que bebo,
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.
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Nem nunca, propriamente reparei,
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? Serei
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Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.
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ÁLVARO DE CAMPOS
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Foto de Ulvi Magerramov

ECO

 


ECO


Vagas são as promessas e ao longe,

muito longe, uma estrela.

 

Cruel foi sempre o seu fulgor:

sonâmbulas cidades, ruas íngremes,

passos que dei sem onde.

 

Era esse o meu reino e era talvez essa

a voz da própria lua.

Aí ficou gravada a minha sede.

Aí deixei que o fogo me beijasse

pela primeira vez.

 

Agora tenho as mãos vazias,

regresso e sei que nada me pertence

- nenhum gesto do céu ou da terra.

Apenas o rumor de breves sombras

e um nome já incerto que por mágoa

não consigo esquecer.

 

FERNANDO PINTO DO AMARAL

 

Foto de Olga Maleeva


INÚTIL PAISAGEM de ANTONIO CARLOS JOBIM

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